quarta-feira, 9 de novembro de 2016

FORMAR LEITORES: EIS A QUESTÃO!

FORMAR LEITORES: EIS A QUESTÃO! [09/11/2016] Lena Lois "Os jovens de hoje não lêem!!" É muito comum hoje em dia escutarmos frases desse tipo vindas de pais e professores. Sem dúvida, os baixos índices de leitores no Brasil, sinalizados por diversas pesquisas, é um dado concreto. Estudos revelam que a média de livros lidos num país desenvolvido (a França foi tomada como exemplo maior) é de nove ao ano. O Brasil não atinge nem metade desse número! Os motivos para os insucessos da leitura são de diversas ordens. A extensa geografia do país, que impede que muitos programas educacionais cheguem às mais remotas regiões; a precária formação de muitos professores; a dificuldade de acesso aos livros (existem muitos municípios que não possuem uma única livraria ou biblioteca) e, a própria compreensão limitada sobre o ato de ler. Já não é mais tempo de discutir sobre os desusos da decodificação pura ou da grande importância do letramento. Muito menos produtivo é questionar de quem é a culpa na falta de interesse pela leitura, se da televisão ou da internet. Os conceitos de leitura, ato de ler e leitor andam imbricados num movimento dinâmico, e singular para cada um, e extrapolam todas essas proposições. Quando a criança entra na escola, mesmo na educação infantil ou na creche, ela já traz o seu repertório leitor. Não só um repertório de textos ou histórias que lhe são contadas, mas as suas próprias conjecturas, fantasias e imaginações sobre o entorno. O seu exercício de compreensão e explicação do mundo inicia com a criação de realidades paralelas. E essas realidades paralelas nascem de sensações. Sim, as primeiras leituras caminham lado-a-lado com as emoções. E é por isso que a literatura penetra no cenário infantil com o papel maior que o de promover leituras: ela se oferece gratuitamente, inteira, para que esse pequeno leitor inicie seu passeio metafórico na compreensão do mundo através da magia. A literatura pertence ao mundo das artes e é pela arte que a criança inicia seu ofício de leitor, participando das aventuras, vibrando com as conquistas, expressando seus sentimentos sobre determinadas situações. A literatura ajuda a organizar os pensamentos e construir hipóteses para compreender o mundo. A literatura promove comunicações entre quem lê e quem escuta a história. O incentivo à leitura da literatura na sala de aula é muito importante porque dessa forma não se quebra o fio que um dia uniu o leitor do mundo ao leitor do texto, da fantasia e da arte. Quando a escola encontra uma forma de destacar momentos literários, ela está permitindo que haja um espaço que transcende os espaços pedagógicos onde o aluno é valorizado em sua essência subjetiva. Ele fala. O professor escuta. Ele exercita suas possibilidades críticas e passa a confiar mais em suas reflexões. Dessa forma, também leva para o dia a dia de sala de aula uma outra forma de se relacionar com o ato de aprender. A prática de oficinas literárias (1) cumpre esse papel. Com apenas um encontro semanal de uma hora, onde os alunos se reúnem com os mediadores de leitura e, através de técnicas lúdicas se encontram com a literatura, podemos perceber a construção de uma relação diferenciada com o texto, a criatividade e seus desdobramentos. É priorizada a liberdade de expressão nesse momento. Nada se cobra sobre gramáticas ou ortografias, apenas se incentiva a invenção através da arte literária. Eles trocam idéias, realizam jogos, criam textos e aventuras e fazem desse momento um encontro de prazer com a leitura. Costumo dizer que dentro de todos os alunos existe um leitor, entretanto é necessário que se dê a ele motivos para aparecer. A importância da leitura será vista na proporção de sua função para a vida. De nada adianta impor o texto escrito sem que se apresente uma experiência de prazer sobre ele. E a literatura é essa experiência de prazer. Atuar através da arte é permitir que haja espaço para o simbólico - condição essencial do homem. A literatura não é uma forma de aprender sobre algo. Não é pedagogia. É arte. É um veículo para se aprender sobre o mundo e a humanização do homem. E penso que ensinar sobre humanização também seja papel da escola. Nota 1 Oficinas literárias: tecnologia social capaz de atrair grupos de crianças e jovens para o meio artístico/literário, culminando na sua formação leitora. Lena Lois é psicóloga, especialista em literatura pela UFBa, atualmente é diretora da Asa da Palavra - oficina e consultoria em literatura. Autora do livro "Teoria e prática da formação do leitor: o uso da literatura em sala de aula".

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