terça-feira, 19 de julho de 2011

Perfil do profissional da informação e o Mercosul

Perfil do profissional da informação e o Mercosul

Maria Yêda F. S. de Filgueiras Gomes
Maryvonne Palma de Mello
Maria Consuelo Pinheiro Santos
Professoras da Escola de Biblioteconomia e

Documentação da Universidade Federal da Bahia

Brasil
Introdução
Com a globalização da economia, a competitividade entre emprêsas e países tornou-se intimamente ligada à qualidade do sistema de informação de que se dispõe em relação aos seus concorrentes. Cabe ainda destacar que a globalização está associada ao progresso das telecomunicações, à disponibilização das informações em tempo real e às novas técnicas de marketing. Nesse contexto, o mercado de trabalho tornou-se mais seletivo passando a exigir dos profissionais da informação maior versatilidade, melhor performance na capacidade de comunicação e habilidades específicas não encontradas plenamente desenvolvidas nas profissões já existentes. Conforme chama a atenção Barreto (1996, p. 146), a informação, nesse ambiente de grandes e aceleradas mudanças, passa a desempenhar múltiplos papéis ...Atualmente, as discussões sobre acesso à informação de forma universal, privacidade nas telecomunicações, fluxo de dados transfronteira, direito e propriedade intelectual na era da Internet, aspectos políticos, legais e éticos como acesso igualitário à informação por países ricos e pobres tornam evidente que há muito por fazer, e isso dá outra dimensão ao trabalho do profissional da informação, se visto sob a ótica da multidisciplinaridade que a sobrevivência em tempos de globalização exige.

A formação de blocos econômicos, tais como o Mercosul e a ALCA, este último ainda em gestação, que pretende integrar todos os países da América, assim como o acesso às informações de todo o mundo, através de redes de computadores, colocam em relêvo a importância do profissional da informação. Entendemos que esse profissional, além de manipular, articular e dominar tecnologia e serviços informacionais, deve também compreender o processo de produção e distribuição da informação enquanto conhecimento, ou seja, é necessário que êle compreenda cada conhecimento a partir da realidade sócio-histórica na qual êle foi construído.

Apresentamos, a seguir, considerações gerais sobre o papel e funções do profissional da informação e algumas de suas competências indispensáveis na especialidade Fundamentos da Biblioteconomia e da Ciência da Informação, abordando certos conhecimentos que êle deve dominar nessa área para que possa melhor desempenhar tais funções e papel numa sociedade globalizada.
Papel e funções do profissional da informação

No quadro de instabilidade econômico-financeira do mercado mundial, com reflexos imediatos nos países do Terceiro Mundo, onde a América Latina se insere, e agravado pela instabilidade política e pelas transformações tecnológicas, a delimitação do perfil do profissional da informação torna-se muito difícil. Na verdade, as mudanças operadas pela inovação tecnológica nos setores de informática, de rede de computadores e de telecomunicações vêm afetando a concepção tradicional de bibliotecas e, consequentemente, introduzindo mudanças na formação do bibliotecário, a fim de que este possa desempenhar melhor suas novas funções e fazer face aos desafios inerentes à era da informação eletrônica. De acordo com Vieira (1993, p. 111), alguns elementos podem ser apontados como determinantes da demanda por um novo profissional da informação para esse tempo de mudanças: novos tipos de usuários, novos assuntos interdisciplinares, novas tecnologias da informação e da comunicação, novas categorias de informação introduzidas pela associação da informática com os sistemas óticos, novos estilos de trabalho propiciados pela telemática, novas responsabilidades éticas no lidar com a informação, novos ambientes de trabalho marcados pela ergonomia.

Assim é que, a globalização da economia e o advento dos mercados comuns, como é o caso do Mercosul, vêm pressionando a classe biblioteconômica a promover estudos comparativos sobre a formação profissional, suas legislações e seus mercados de trabalho. Com essa perspectiva, os profissionais vêm se mobilizando de forma bem mais evidente na atualidade do que em períodos anteriores, no sentido de promover encontros, seminários, reuniões e outros eventos semelhantes, para discutir com seus pares latinoamericanos e de outras partes do mundo, questões relativas à constituição de um currículo que possa atender às expectativas de formação de um novo profissional capaz de responder aos desafios relativos às transformações que vêm ocorrendo na sociedade.

A formação desse profissional deve, portanto, refletir essas mudanças. Sua função está evoluindo e suas competências não serão avaliadas somente em termos da quantidade e qualidade da informação fornecida, mas, sobretudo, a partir do tempo economizado para os usuários. Êle será o “refinador” da informação com a função de criar informação com valor agregado para serviços específicos. Além disso, a utilização crescente das novas tecnologias pelos serviços de informação indica uma tendência de transformar o posicionamento do bibliotecário, de profissional passivo para agente disseminador da informação, tornando-o apto a usar os recursos tecnológicos disponíveis, capaz de promover, de forma ativa, a transferência da informação para os seus usuários e não apenas como um mero repassador desta. Nesse sentido, o mercado está a exigir profissionais preparados para o tratamento eletrônico da informação, para a orientação do usuário na navegação eficaz das redes e para a análise e decodificação dos conteúdos de informação. Os profissionais da informação devem prestar serviços crescentes a atores e setores não-tradicionais (bancos, empresas, profissionais liberais, etc.), e não apenas nos espaços em que até agora vêm atuando, como bibliotecas, centros de documentação, etc., combinando habilidades tecnológicas e capacidade de analisar políticas, com uma forte orientação para o cliente. Em assim sendo, os novos desafios que o profissional vem enfrentando são responsáveis pelas mudanças inevitáveis de seu papel, muitas vezes obrigando-o a desempenhar uma função multifacetada. Esse processo evolutivo vem apresentando, até então, uma diversidade de categorias profissionais direcionadas para a área de informação.

Ao abordar o papel do profissional da informação numa sociedade em mudança, Araújo (1986, p. 12) afirma que esse papel passa necessariamente por sua colocação política e crítica diante da realidade. Além disso, deve ser fundamentalmente dinâmico e agressivo e dotar-se de instrumentos de outras áreas técnico-científicas, assumindo o caráter interdisciplinar inerente às atividades de informação: da Economia, deve retirar os subsídios para elaboração de políticas de preços e análise de custo/benefício/eficácia para os serviços e produtos; da Administração, deve absorver as técnicas de planejamento e gerenciamento de serviços e estratégias de marketing para atingir o mercado potencial com o mínimo de custo operacional e máximo de resultados; da Comunicação, deve utilizar as técnicas de elaboração e veiculação de mensagens que divulguem os serviços e produtos oferecidos no mercado; da Sociologia e Antropologia, deve retirar os conceitos básicos sobre as leis de comportamento social e as regras subjacentes à organização da cultura.

Para Antonio (1991, p. 79), o novo profissional da informação deve compreender o panorama histórico em processo, bem como exercer novas funções em sistemas avançados de informação. Sua capacidade intelectual deve sobrepor-se às suas habilidades operacionais. Consideramos ainda que, além desse aspectos, esse profissional deve ser mais criativo e sintonizado com a aplicação das novas tecnologias da informação, sobretudo nas atividades de organização e recuperação da informação: deve ser capaz de criar, desenvolver e gerenciar unidades e serviços de informação adaptados às possibilidades tecnológicas e às necessidades dos usuários. Consequentemente, deverá ter uma competência profissional ampla envolvendo conhecimento interdisciplinar, habilidades gerenciais, técnicas e políticas, além de atitude ética.

Vários conceitos científicos foram desenvolvidos em disciplinas periféricas à Ciência da Informação e o profissional da informação deve dominar conceitos tais como: conceitos linguísticos, ligados à análise e indexação de documentos: conceitos textuais (sintagmas, índices) e conceitos paratextuais (título, resumo, palavras-chaves, descritores, citações, referências bibliográficas); conceitos sociológicos, como os de comunidade científica, rede de comunicação e uso; conceitos psicológicos, como necessidade de informação, interação e atitude; conceitos lógicos, como os da lógica booleana e os da lógica difusa. Os conceitos técnicos, voltados para a normalização, relacionam-se, por exemplo, à gestão e armazenamento de documentos: referência bibliográfica, tesauro, catálogo, entre outros.

O novo perfil desse profissional deve, assim, combinar características das áreas de informática, comunicação social, administração, economia, linguística, biblioteconomia, documentação e ciência da informação, sem, contudo, deixar de se considerar uma formação humanística, pedagógica e social, voltada para uma filosofia educacional mais ampla, flexível, integrada e crítica.

Competências na especialidade fundamentos da biblioteconomia e da ciência da informação

O estudo da informação enquanto fenômeno é a própria base da harmonização das funções, e favorece o aprofundamento dos conceitos fundamentais na Ciência da Informação, permitindo situar melhor as instituições (bibliotecas, centros de documentação e serviços de arquivos) e as profissões (bibliotecário, arquivista, especialista da informação).

Saracevic (1974, p. 44), ao comentar sobre a motivação e a justificativa para o ensino da Ciência da Informação, destacou os seguintes aspectos: primeiro, um profissional, para ser um profissional, tem que entender as bases experimentais e teóricas do seu trabalho. Segundo, um profissional, para permanecer como tal, necessita da capacidade de absorver, durante a sua vida profissional, os avanços experimentais e teóricos referentes ao seu trabalho; e terceiro, a realização e a demonstração da mais alta competência profissional são a capacidade de traduzir e adaptar o trabalho experimental e teórico em geral a soluções de problemas práticos específicos.

Tomando como base as idéias acima mencionadas, apresentamos alguns conhecimentos que julgamos essenciais para que esse profissional possa desenvolver suas competências nessa área, em sintonia com as exigências da sociedade globalizada. Para tanto, êle deverá dominar:

- O conhecimento da gênesis e do desenvolvimento de processos e fenômenos informacionais em diversas áreas, objetivando abordar a contextualização multidisciplinar desses processos, buscando formulações teóricas que atuem como elos interdisciplinares em torno do objeto informação.

- O conhecimento das teorias, dos paradigmas e das tendências da informação.

- O conhecimento da dinâmica e das necessidades de informação da sociedade, o que permite compreender por que as pessoas se envolvem num processo de busca de informação (exigências oriundas da vida social, de saber, de comunicação, entre outras).

- O conhecimento específico da Biblioteconomia e Ciência da Informação em seus aspectos conceituais, funcionais e metodológicos.

- O conhecimento da relação entre Ciência da Informação, Biblioteconomia e disciplinas correlatas.

- O conhecimento comparativo da Biblioteconomia e Ciência da Informação em diversos contextos, a fim de que a variedade de situações estimule a criatividade na identificação de soluções igualmente diferenciadas.

- O conhecimento das leis, como as leis bibliométricas, que embora não permitam compreender o comportamento social responsável pelas observações registradas, são úteis para o gerenciamento de acervos disponíveis e, mais comumente, nos processos de tomada de decisão.

- O conhecimento das barreiras que dificultam ou impedem a comunicação da informação, para poder eliminá-las ou minimizá-las.

Com essa fundamentação teórica e o domínio desses conhecimentos, os profissionais da informação estarão melhor capacitados e habilitados a:

- Analisar os fenômenos dos fluxos de informação nos processos informais e/ou formais de comunicação, de diferentes tipos de comunidades, articulando-se com os diversos agentes do ciclo da informação.

- Agregar valor à informação do ponto de vista seletivo, crítico e de conteúdo.

- Entender a informação como recurso econômico e estratégico.

- Compreender as necessidades de informação da sociedade.

- Identificar demandas e necessidades de leitura e informação dos diferentes grupos sócio-econômico-culturais.

- Antever os possíveis usos das informações coletadas ou produzidas internamente nas organizações.

- Relacionar a área de Ciência da Informação à prática em bibliotecas e em qualquer sistema de informação, sabendo traduzir e adaptar os resultados da teoria e da experimentação e aplicá-los a problemas práticos específicos.

- Organizar o conhecimento, atendendo às limitações impostas pelos diferentes tipos de conhecimento e por meio de ferramentas linguísticas e conceituais adequadas.

- Armazenar e recuperar a informação, tornando-a mais acessível aos usuários.

- Identificar eventuais lacunas ou duplicidade de coleta e armazenamento da informação.

- Examinar as condições de acesso e disseminação da informação.

- Identificar os problemas de transferência da informação e saber realizá-la.

- Definir parâmetros de avaliação da informação.

- Realizar a comunicação efetiva, de modo a permitir a interpretação, empatia e cordialidade nos relacionamentos interpessoais com os usuários.

- Entender e acompanhar a literatura sobre a Biblioteconomia e a Ciência da Informação em sua vida profissional.

Conclusões
As possibilidades do profissional da informação ingressar e se estabelecer em novas fatias de mercado estão cada vez mais condicionadas à sua bagagem profissional, experiências e trabalhos realizados. Isso implica, entre outras coisas, no domínio das teorias, paradigmas e tendências da informação; dos parâmetros contextuais e cognitivos da transferência de informação, com vistas ao processo de produção e uso do conhecimento, o que se constitui em objetos de estudo importantes e necessários a esse profissional. Além desses conhecimentos, êle deve dominar conceitos científicos desenvolvidos em áreas periféricas à Biblioteconomia e Ciência da Informação. Conforme enfatiza Berto (1996, p. 145).

A integração e a interação dos bibliotecários com profissionais e disciplinas de outras áreas são, no momento, parte dos requisitos necessários e fundamentais ao acompanhamento das modificações tecnológicas, paradigmáticas e instrumentais na área de informação, de maneira a capacitarem-se e a identificarem-se como profissionais de informação inseridos em equipes multidisciplinares.

Tais aspectos, entretanto, não podem ser vistos isoladamente, considerando-se que em tempos de economia globalizada torna-se imperativo que os conhecimentos específicos de cada área se agreguem em proveito da consecução de um objetivo comum; ou seja, os serviços e produtos a serem oferecidos serão tão globalizados quanto o mercado a que se destinam. Por outro lado, a articulação desses conhecimentos, embora importante e necessária, requer do profissional da informação uma consciência muito clara das características e especificidades da sua área de atuação. Nessa mesma linha de pensamento, Berto (1996, p. 146) destaca ainda que, a modernização de papéis e funções nas profissões de informação suscitam a premência de avaliação, alteração, atualização e unificação de competências do bibliotecário, para que se amplie o elenco de atividades onde possa atuar sem ‘fugir’ de sua área de formação e competência iniciais, como que reconhecendo a ‘falência’ da profissão.

Referências Bibliográficas

Antonio, Irati. Do Bibliotecário ao Agente da Informação: seu perfil diante de novas tecnologias. Revista Brasileira de Biblioteconomia e Documentação, São Paulo, 24 (1-2): 76-85, jan. / jun. 1991.

Araújo, Vânia Maria R. H. de. Papel do Profissional da Informação em uma Sociedade em Mudança. Ciência da Informação, Brasília, 15 (1): 11-13, jan. / jun. 1986.

Barreto, Auta Rojas. Informação Empresarial para o Mercosul: a expansão das fronteiras das microempresas. Ciência da Informação, Brasília, 25 (1): 144-149, jan. / abr. 1996.

Berto, Rosa Maria V. de Souza. Carreira do Futuro ou o Futuro da Carreira. Transinformação, Campinas, 8 (1): 144-157, jan. / abr. 1996.

Saracevic, Tefko. Curso sobre Ciência da Informação para Estudantes de Biblioteconomia. Revista da Escola de Biblioteconomia da UFMG, Belo Horizonte, 3 (1): 40-64, mar. 1974.

Vieira, Anna da Soledade. Desenvolvimento de um Novo Profissional para um Novo Tempo. Revista da Escola de Biblioteconomia da UFMG, Belo Horizonte, 22 (1): 111, jan. / jun. 1993.

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